“Uma câmera na mão, e uma ideia na cabeça”, a revolucionária frase de Gláuber Rocha como sugestão a quem queria fazer cinema no começo dos anos 60. Nos tempos atuais, aplicada à música, pode ser ene equipamentos, de um celular caprichado, um notebook, um gravador de voz digital Tascam. Foi uma ideia na cabeça, um violão, e acessórios sem grandes recursos que o músico Gustavo Infante gravou seu terceiro disco, Pássaros (Selo Bastet). Aliás, o minimalismo faz-se presente até no release do álbum, o mais curto que já li:
“PÁSSAROS é o segundo álbum do compositor, violonista e cantor Gustavo Infante. Resultado de seu processo contínuo de investigação com processamentos (Reverb e Delay), tape loops, fita cassete, voz, violão e canção, todas as faixas foram gravadas pelo próprio artista em fita cassete e microcassete em sua casa”. Nos créditos das canções, lê-se: “Vozes, Violão, Tape e Processamentos – Gustavo Infante”
O álbum traz 14 faixas, apenas uma não é assinada só por Gustavo Infante, Flechas no Coração, parceria com Rômulo Fróes. O disco inteiro é de leveza e sutileza. A citada Flecha no Coração soa como uma canção infantil, mas a letra versa sobre um amor desfeito. Um contraste que está presente no conceito do disco. Embora as canções sejam suaves, assim como a interpretação vocal, em várias faixas Infante, imprime uma dinâmica no violão, com mudanças rápidas de acordes, de andamento, como se o acompanhamento fosse um veículo passando velozmente, e a melodia a paisagem.
Com a ação do processamento, músicas simples, tornam-se complexas. A canção Canoa de Dentro, tem uma melodia pastoral, porém, o violão pela metade da música acelera, num quase rasqueado. O interessante em Gustavo Infante é sua forma de compor, a partir de idéias curtas, que vão se transformando, células sendo repetidas, hai-kais sonoros.
As letras acompanham quase sempre o conceito do álbum: “Maré cheia/ maré de caracóis/ maré cheia/ maré de caracóis/o sonho esfumaça/ cobre no cobertor/ espirais do sol/ espirais de sal/ da concha que vem/ da concha que vai”. Canções que não se encaixam em nenhum gênero de música brasileira, tampouco na sigla reducionista, hoje sem sentido, de MPB. Mal comparando as canções se parecem com temas de Erik Satie, com letras. Mixagem e masterização de Sérgio Machado, a capa de Letícia Rodrigues. Álbum recomendadíssimo.
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