“A história é uma coisa que não aconteceu contada por uma pessoa que não estava lá”. Não sei de quem é a frase, mas já a empreguei dezenas de vezes. Sobretudo quando escrevo sobre biografias. Tô lendo Set The Night on Fire – Lying, Dying, and Playing Guitar with The Doors, de Robby Krieger, ou seja, uma autobiografia (escrita com a ajuda do jornalista, cineasta e músico Jeff Alulis). Krieger, guitarrista subestimado, é autor de um clássico dos anos 60, até hoje na programação das FMs, que não se curvaram à bagaceira musical: Light My Fire.
“Se você tamborilar junto no tempo de Light My Fire, que quando os instrumentos silenciam, John (Densmore) toca em três, quando deveria estar em quatro. Na última nota de Chrystal Ship toco um acorde menor, e Ray (Manzarek) um maior. No primeiro “chorus” de Break on Through, Jim (Morrison) canta “Break on Through to the Other Side” três vezes, no Segundo canta apenas duas vezes. Se o álbum da gente fosse gravado hoje, o tempo da bateria de John seria acertado, Ray e eu tocaríamos as mesmas notas, e os vocais de Jim seriam editados. Mas não tínhamos computadores, e só quatro canais para trabalhar (…) mas só feliz em ter gravado os álbuns de The Doors quando e como fizemos. As imperfeições são o que fazem ele pulsar”.
Em 1967, quando The Doors gravou o álbum de estreia, o sucesso era feito pelo rádio AM, quase tudo conservadora, o que até se compreende, as mudanças comportamentais foram drásticas e rápidas. As FMs começavam, nem todo aparelho tinha faixa em FM, boa parte dos automóveis também não. A música que os integrantes de The Doors pretendiam puxar o disco era Light My Fire, mas ela se estendia por seis minutos, o triplo do tempo da duração média do que tocava nas Mas. As FMs eram mais abertas às novidades. Foi na KBLA, primeira FM da Califórnia, em que um apresentador chamado Dave Diamond, incluiu Light My Fire, na íntegra, no seu programa Diamond Mine.
Krieger revela que a prática do jabá indireto não é uma jaboticaba, acontece só no Brasil. O jabá indireto é aquela prática de que Chacrinha foi mestre. Levava o artista ou banda para se apresentar em seu programa, em compensação, estes tinham que participar de caravanas musicais, comandadas pelo apresentador, pela periferia do Rio, até em outros estados, sem cachê. “A gente teve de tocar no Cheetah, em Santa Monica, numa promoção do DJ Humble Harve da FM KHJ, pruma plateia de três mil, e ele ficou com quase toda renda”, conta Krieger. Mas Harve tinha audiência, tocou tanto Light My Fire que a música chegou ao topo do paradão da Billboard. Daí em diante, The Doors tornou um dos grupos mais bem sucedidos do rock mundial.
Deixe um comentário