João Gilberto e Nelson Gonçalves correndo demais

Em 1971, Caetano Veloso, ainda morando em Londres, veio duas vezes ao Brasil, a primeira para celebrar as bodas de ouro do casamento dos pais (para a qual Maria Bethânia precisou pedir autorização aos militares),  a segunda a pedido de João Gilberto, que pretendia gravar um programa com ele e Gal Costa para a TV Tupi.

Na ida para São Paulo para gravar, João Gilberto enfiou o pé no acelerador do Opala, e foi pego pela Polícia Rodoviária Federal por excesso de velocidade. Na época ele estava muito badalado. Depois de viver quase dez anos nos Estados Unidos e México, voltou naquele desta vez para ficar. Foi pego na Via Dutra. O patrulheiro começava a fazer a multa, quando o companheiro de João, um amigo a quem deu carona, conversou com o guarda. Explicou que aquele era João Gilberto. O patrulheiro pediu que eles o acompanhassem até o posto da PRF, João foi com o violão. Lá dentro, cantou algumas de seus sucessos. Foram embora, ele e o amigo, sem multa. Nesse show prive, João deve ter cantado “Isso aqui, iô-iô/é um pouquinho de Brasil ia-iá”, de Isto Aqui o Que É? de Ary Barroso.

NELSON

Quem também foi pego dirigindo além da velocidade permitida foi Nelson Gonçalves, e em estradas do seu estado natal, o Rio Grande do Sul. Os patrulheiros chegaram juntos do carro, perguntaram por que a pressa. Nelson disse quem era, e que corria para não se atrasar para um show. Os guardas entreolharam-se, achando que o motorista apressado estava mentindo. Nelson insistia que ele era ele. Até que um guarda, querendo por um ponto final, à discussão, falou: “ Pois bem se tu és Nelson Gonçalves canta um pouco pra gente”. Nelson, com o vozeirão que possuía, nem precisou de violão. Soltou a voz. Quando terminou o guarda disse: “Tu não és Nelson Gonçalves não, mas canta bem parecido com ele. Vai embora”.

João Gilberto no início da carreira soltava a voz sem economia, assim como Nelson Gonçalves, tentava cantar como o ídolo Orlando Silva. Ao longo dos anos, como um Picasso, que começou figurativista, foi decupando as pincelada até dizer tudo o que queria em poucos traços, João Gilberto foi suprimindo o que fosse dispensável no seu canto até chegar ao formato que, com as harmonia inovadores ao violão, é a bossa nova. Sem João haveria grandes canções, mas não bossa nova. Mas ele continuou gostando de cantores de vozeirão. Em 1960, à Revista do Rádio, derramou-se em elogios a Nelson Gonçalves, contou que quando menino, em Juazeiro (BA), sonhava em ser igual ao seu ídolo quando crescesse.

Na foto, de 1959, reproduzida da revista O Cruzeiro, João canta na praia para as meninas de Copabacana. À direita dele, uma embevecida adolescente de 17 anos, chamada Nara Leão.

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