Entrevista – Almério conversa sobre o disco em que canta Cazuza, e o show desse domingo, 15 de maio, no Teatro do Parque

Tudo É Amor – Almério Canta Cazuza é um tributo ao cantor e compositor carioca, falecido em 1990. O disco foi gravado em 2021, teve dois shows de pré-lançamento, como um teste à reação do público, apresentados no interior de São Paulo. A estreia oficial, nacional, acontece neste domingo, 15 de maio, no  Teatro do Parque, no Recife.

 Nascido em Altinho, no agreste pernambucano, mas com carreira iniciada em Caruaru, Almério é uma das novas, e celebradas, vozes da MPB. No tempo em que ganhava a vida como cantor nos bares caruaruenses nunca imaginava que um dia gravaria um álbum com canções do seu ídolo Cazuza, onipresente no repertório que trabalhava da época. Muito menos um álbum com participação de Ney Matogrosso, ex-namorado, e o grande intérprete de Caju (como os amigos chamavam Cazuza).

Nesta entrevista a telestoques.com, Almério fala sobre o disco dedicado a Cazuza, a entrega total ao projeto, a ponto de adoecer depois que o terminou, como foi gravar em plena pandemia, e sobre o show que circulará pelo país, mas sem ser spoiler, não entregou o jogo. Então, só indo ao teatro para saber das surpresas que Almério reservou para debutar a turnê Tudo É Amor.

Telestoques – Almério Cazuza é muito confessional nas suas letras. Escrevia sobre seus próprios sentimentos de maneira mais pessoal possível. O intérprete precisa incorporar um Cazuza para compartilhar com o público essas confissões e reflexões particulares, ou adaptar Cazuza à sua própria experiência pessoal?

Almério – Quando eu comecei a me preparar para botar voz nas canções, nos novos arranjos, foi que descobri como era difícil cantar Cazuza, porque eu já fazia nos bares, mas não num trabalho conceitual, como Tudo É Amor. Foi aí que descobrir o cantor Cazuza. Eu tinha este olhar limitado sobre ele, sempre enxergava o grande compositor, não sabia o quanto ele imprimiu uma coisa tão orgânica, tão espontânea que é o jeito dele cantar. Cada artista escolhe um caminho, eu como interprete eu prefiro dar outro tom, outras cores para as canções dele, me distanciar o máximo possível do que ele fez e fazer a minha onda mesmo. Foi aí que tive dificuldade de trazer estas canções do meu jeito, de vesti-las com a mesma força com que ele cantou, mas do meu jeito. Foi uma dicotomia: ao mesmo tempo em que tinha que ficar superpróximo de Cazuza, pesquisar pra chegar num lugar de propriedade do que estava cantando, orgânico, tive que me distanciar, foi árduo um período de pesquisa até chegar a este lugar aonde o disco chegou.

Telestoques – Cazuza morreu há 31 anos, o que leva intérpretes feito você a continuarem gravando sua música, muitas delas feitas há 40 anos?

Almério – Quando recebi o convite de Ione Costa, que me ligou em 2020, em meio à pandemia. Ela é a idealizadora do projeto, montou uma produtora, Parças do Bem pra este projeto acontecer. Quando ela me fez o convite eu disse, mas amiga já cantei muito Cazuza nos bares, sei cantar Cazuza com os pés nas costas de tanto que já cantei. Eu não tenho nada a acrescentar, acho que as interpretes e os discos que fizeram homenagem a ele cumpriram isto muito bem, tem discos relevantes. Fiquei muito reticente. Ione e André Brasileiro me fizeram olhar por outro prisma disseram assim: imagine você trazer Cazuza para uma geração que não o conhece, com sua voz, sua atmosfera, do seu jeito “pernambucânico” de ser artista. Foi por isto que decidi cantar Cazuza este poeta imortal e atemporal

Telestoques – Houve várias Cazuzas, o romântico, o autodestrutivo, o rebelde, o político, como você rearrumou estes personas no seu disco.

Almério – Eu sou estas intempéries todas também. Entrar no estúdio não foi tão fácil, teve um trabalho de meses antes. Fiz um mergulho na obra de Cazuza, só ouvia Cazuza, passei por um processo sofrido de entrar tanto na obra dele que, de alguma forma, comecei a absorver numa pandemia, de quarentena. Sentia umas dores, umas sensações que não eram só minhas. Tanto que quando terminei o trabalho de estúdio tive uma febre emocional, pensei que estava com covid, me tremendo, suando debaixo do cobertor uma noite inteira. Fiquei meio desorganizado das ideias, porque me entrego muito ao meu trabalho, sem pensar, me jogo no abismo. Estas fases estão em mim, quando se somou esta energia potente, latente à obra deste poeta fortíssimo, visceralíssimo deu um babado forte.

Telestoques – Como foi elaborado o conceito do repertório?

Almério – Foi sugerido o nome de Marcus Preto, um diretor artístico de nível nacional, trabalha com grandes estrelas, achei que ele iria topar. Fiquei meio tímido, apreensivo, pra minha surpresa ele aceitou de cara, conhecia meu trabalho, se jogou, e fez uma equação maravilhosa de repertório, queria que as música de Cazuza voltassem sendo minhas, e fomos pro lado B. Muitas canções de lado B, as pessoas não tiveram acesso. Marcus separou três superhits, três semi-hits e cinco lados B. São onze canções. Entre estes lados B ele resgatou Companhia, que Zizi Possi gravou, e passou despercebida. Com os arranjos de Pupillo, Juliano fantástico na guitarra, a música ganhou uma sobrevida, e ficou uma música nossa. A partir desta equação o repertório foi pensado por quatro cabeças, eu, Ione Costa, André Brasileiro e Marcus Preto. Fomos sugerindo títulos. Ione trouxe canções lindas, André também canções lindas, eu escolhi algumas, que faziam parte desta ligação que eu tinha com Cazuza, e assim a gente construiu este disco de que tenho orgulho em tê-lo feito.    

Telestoques – É provável que quando você começou a cantar tenha se imaginado cantando com algum grande da brasileira. Ney Matogrosso estaria entre estes? E como você trouxe ele pro disco?

Almério – Quando a gente começou a cantar, a bora de Cazuza por ter sido imensa demais, acessado tantos corações, ela poderia me engolir, a gente teria que ter vozes fortes pra cantar esta história com a gente. Então, claro, foi unanime o nome de Ney Matogrosso, por toda a história que Ney viveu com Cazuza, foram namorados, muito amigos, Ney cantou muito a obra de Cazuza, e é pra mim interplanetário, uma das vozes mais poderosas do mundo.  Obra de Ney ela tem que ser esmiuçada, estudada nas faculdades, a obra de Ney é brilhante um rastro de luz. Novamente fiquei nervoso, será que ele vai topar? Ficou a ansiedade no peito. Ele nos ensina muito. Foi supergeneroso. Quando fomos botar voz ele pediu que o dirigisse cantando; Depois saímos pra jantar, ele cantou história. É sempre bom tê-lo por perto. A outra voz, tinha que ser uma mulher. Tantas mulheres estiveram ao redor de Cazuza, mulheres fortes como Sandra de Sá, Marina Lima, Bebel Gilberto. Quando veio o arranjo de Eu Queria Ter Uma Bomba, eu precisava de uma voz que doesse comigo, e ao mesmo tornasse esta dor mais leve. Ela sempre deixa a coisas mais leves e fortes, Céu. Esta duas vozes elas se avizinham deste projeto com toda beleza possível

Telestoques – Quando irrompeu a pandemia você estava circulando muito pelo Sudeste. Quais as consequência da obrigação de se recolher por quase dois anos?

Almério – De recomeçar eu entendo muito bem. Quantas e tantas vezes nesta vida de artista. Quando optei por ser cantor eu não tinha de quantas ir renascer nesta vida, muitas e muitas vezes, e tantas vezes precisar eu renascerei. Neste dois anos em que tivemos que nos resguardar. Há artistas que estão num patamar maior, uns mais outros menos, a gente teve que recomeçar mesmo, não foi difícil porque a minha luta já parte de mim. Parafraseando a música que começa o disco, A Luta, é isto levantar a cabeça e sua música e sua espada. Desrespeitado como fomos, abandonados, por um desgoverno um despresidente, então devemos fazer da nossa arte nossa espada e lutar contra estas mazelas todas.

Telestoques – Este disco foi lançado em novembro de 2021,portanto foi gravado ainda durante uma fase pesada da pandemia. Como foi feita a gravação?

Almério – Um disco que nasce do caos, da dor, que nasce da dor da alma. Estávamos perdidos, desnorteados. Em final de outubro, começo de novembro de 2020 estávamos todos perdidos. Viramos uma piada na boca do presidente. Sendo desrespeitado diariamente por tudo isto que o desgoverno causou, e ainda teve de lidar com um vírus mortal, as pessoas indo embora, num desses família dizimadas pelo vírus, num desespero sem precedentes. Ele nasce daí. Nos trancamos num estúdio durante dez dias, isto no possibilitou de criar arranjos muito verdadeiros. E O projeto vem daí. Tem muita coisa nas entrelinhas deste disco, que a gente só vai perceber depois a gente se afastar um pouco deste lugar terrível em que a gente veio parar. A gravação foi um oásis pra gente, por se encontrar em segurança. Enquanto gravávamos a gente se esquecia do mundo lá fora. Eu acordava muito cedo, ia prum parque fazer nossas orações, cantando, me conectar com a obra, cantar as músicas pelo parque. A gente estava com a cabeça só pra isso. Só estava com este trabalho pra desenvolver, e isto foi muito legal, muito positivo, o fato de estarmos totalmente voltados pra este trabalho.

Telestoques – Agora você faz o primeiro show de Tudo é Amor, como foi a adaptação do disco para os palcos?

Almério – A direção artística do show é de Marcus Preto, então ele é que fez o repertório, inseriu novas canções, vai ter surpresa, será um show de um rockstar. Fizemos duas pré-estreias em Campinas e Ribeirão Preto, interior de São Paulo, a aceitação do público foi muito forte, pra ver como as canções de Cazuza. Eu estava de espectador do público. As pessoas, choravam, se levantavam. Antes da pré-estreia estava com ansiedade, um espiral de nervosismo. Vi que o show tinha um potencial incrível. Agora esta estreia nacional. Juliano é o diretor musical do show, com um grupo formado por . A luz de Lucia Raposo. Um showzaço, não estou adjetivando pras pessoas, mas pra mim, o show é muito prazeroso.

Telestoques – Certamente você selecionou mais músicas de Cazuza para compor o repertório, se isto aconteceu, algumas dessas entram no repertório do show?

Almério – O repertório do show muda tudo, tenho surpresas maravilhosas até pra mim. Marcus Preto incluiu umas músicas, eu sugeri outras. Mas não vou conta nada, gosto de ver as surpresas na cara das pessoas. Ele é separado por quatro asas, tem nuances, isto me impulsiona, eu adoro, eu me esbaldo quando os movimentos são pensados, o show é marcado, dentro de uma espontaneidade, isto me atrai, afinal sou de teatro. Estou dançando no show. e quero que as pessoas dancem comigo.

Telestoques – Claro, você deve cantar canções dos seus discos anteriores, como conciliou estas canções com as de Cazuza se mexer no conceito do álbum?

Almério – Tudo É Amor, o nome já é um convite a você abrir o seu coração para sentir todas estas sensações. A gente está se permitindo canções que dialoguem com o repertório.

Show Tudo é Amor, de Almério e banda, em estreia nacional, neste domingo, 15 de maio, às 19h, no Teatro do Parque, Rua do Hospício, Boa Vista.

FICHA TÉCNICA DE TUDO É AMOR – ALMÉRIO CANTA CAZUZA

Almério canta acompanhado por Juliano Holanda (guitarra), Rapha B (bateria), Rogê Victor (baixo), Guga Fonseca (teclado)

Diretor musical, Juliano Holanda, diretor artístico, Marcus Preto. Direção corporal, Lilli Rocha, luz, Luciana Raposo, som Vinícius Aquino. Uma produção de Ione Costa, Parças do bem e Atos Produções artísticas.

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