O alemão Horst Fascher administrava o Star Club, uma casa noturna na região portuária de Hamburgo. Em abril de 1962, os Beatles estavam no limiar da fama quando foram contratados para o que seria sua derradeira temporada na Alemanha. Anos mais tarde, Fascher conta que um dia Paul McCartney foi até ele e lhe disse que tinham composto uma nova canção, e se ele se queria escutá-la. Ele disse que o show de estreia da temporada foi muito bom, e queria ouvir a música.
Paul McCartney sentou-se com o violão e começou a cantar Love me Do. Horst Fascher o interrompeu: “Paul é melhor vocês continuarem com o rock ‘n’ roll. Não gostei desta. Ele ficou desapontado. Nunca o vi rosto dele daquela maneira”. O alemão achou a canção muito suave. Paul ficou devastado. Agradeceu a Fascher, mas continuou acreditando em Love me Do. Em 1965, ele comentou com o americano Larry Kane, jornalista e futuro biógrafo dos Beatles. que Love me Do não era a melhor composição da parceria Lennon & McCartney, mas eles queriam gravá-la, e foi com ela que eles passaram a ser conhecidos.
Neste dia 5 de outubro de 2022, completam-se 60 anos, que Love me Do foi lançada, na Inglaterra, pela Parlophone, selo menor da EMI. Um compacto em vinil. Com P.S I Love You, no lado B. Ambas assinadas por Lennon & McCartney. O primeiro disco da banda na gravadora, e que alcançaria um modesto 17º lugar nas paradas inglesas. Dois anos depois, chegaria ao topo das paradas americanas. O início da revolução que o quarteto empreendeu em oito anos de existência, começava sutil, com uma canção tão simples, quanto sofisticada. A letra era quase minimalista, tão básica que parecia ser de domínio público, com seus curtos versos diretos, sem firulas, até ingênuos, de uma música infantil.

Na época, McCartney contou a Kane que Love me Do fora composta em Hamburgo. No entanto, no recente The Lyrics – 1956 to the Present, uma espécie de biografia contada a partir das suas composições, Paul diz que a música foi escrita ainda nos anos 50, em sua casa, em Liverpool.
Paul conta que a maior influência dele e John foi a dupla Everly Brothers, formada pelos irmãos, Don e Phil Everly. “Eles eram diferentes, dois caras bonitos, a gente os idolatrava, queríamos ser feito eles”. Então apareceu Buddy Holly quando a gente estava com 15, 16 anos. Ele ficava bem de óculos para John que usava óculos, que tirou os óculos do bolso para usá-lo. Buddy Holly também compunha e tocava guitarra solo, e cantava. Elvis não compunha, nem tocava solo, era só o cantor. Duane Eddy tocava guitarra, mas não cantava. Então, Buddy fazia tudo. E o nome The Crickets (o grupo de Holly), A gente queria algo assim com duas interpretações. A origem verdadeira do nome The Beatles é ainda meio misteriosa, mas até onde me lembre, queríamos algo com duplo sentido, por causa de The Crickets. Você tinha cricket o jogo, e cricket o inseto (grilo). E se a gente pegasse o nome de um besouro e lhe desse dois sentidos? Você vê Beatles fora do contexto e soa como besouro, não é muito atraente, de início. Mas agora já está aí há muito tempo, já foi assimilado, e não se entende mais como inseto repugnante.

Love me Do foi composta na rua Forthlin Road, 20, num jardim, com uma sebe de alfazema, e um pé de freixo da montanha, que era a árvore preferida do meu pai, que ficava perto da porta da frente. Você passava por isso, e tinha uma salinha, depois com a sala de jantar, que era onde a gente escreveu a maioria das canções na adolescência. John tocou um riff, com a gaitinha. Muito simples. Uma canção que sai assim por acaso, do nada. Mas há um forte senso de saudade, na segunda parte que combina com o solo de gaita que nos emociona de alguma maneira”.
Horst Fascher, com Klaus Voorman (autor do desenho da capa de Revolver, e que participaria de discos solo de Ringo, John e George), segundo Kane foram influentes naquela época sobre o direcionamento da música dos Beatles. Ambos sugeriram que o grupo esquecesse o skiffle (uma versão juvenil do folk americano, eu foi moda na Inglaterra. Love me Do é um skiffle).
“Eles gostavam de Lonnie Donegan”. Lonnie Donegan era um Elvis. Todo garoto inglês eu comprava um violão imitava Lonnie Donegan. Então ele veio a Hamburgo. Eu já escutara algumas bandas de rock ‘n’ roll, feito Derry and the Seniors, Tony Sheridan, e coisas assim. Depois de escutar cinco, seis, sete música, achei que estava farto de taboa de lavar roupa (os grupos de skiffle usavam um tipo de taboa apropriado a lavar roupas, usado nos EUA, como percussão).
BATERISTAS
Os Beatles voltaram pela última vez ao Starclub, no final de 1962, já com disco gravado, e com Ringo como baterista, e com Love me Do tocando nas rádios inglesas. Há três versões da música com bateristas diferentes. A primeira, com Pete Best, cujas habilidades no instrumento não foram aprovadas pelo produtor George Martin. Outra com Ringo Starr, tampouco do agrado (na época Ringo adaptava-se aos Beatles, depois de sair da Rory Storm and The Hurricanes, durante algum tempo a banda mais bem sucedida de Liverpool), e mais uma com Andy White, baterista de estúdio.
A gravação com Pete Best só chegou ao disco, pelo menos oficialmente, em 1995, na série Anthology, a de Ringo Starr foi a que se usou nas tiragens iniciais do compacto. A de Andy White está nas segundas edições do compacto, e no álbum Please Please Me, de 1963. No Brasil, Love me Do teve uma versão com o grupo Renato e Seus Blue Caps, assinada por Renato Barros, faixa do LP Isto É Renato e Seus Blue Caps (1965).
Deixe um comentário