Let it Bleed, dos Rolling Stones, revisitado e recriado por músicos de Nashville,

Em sua biografia, o saxofonista Bobby Keys conta que quando foi convidado para integrar a banda de Joe Cocker (tocou na turnê Mad Dog and Englishman), não entendia quase nada do inglês que ele falava (o do Norte da Inglaterra).  Um detalhe que poucos dão atenção em relação à chamada invasão britânica aos Estados Unidos, iniciada nos anos 60, com os Beatles.

Grupos e intérpretes de um país sem tradição no pop rock, com sotaque estranho, um repertório de músicas já conhecidas pelos americanos, ou se valendo de gêneros americanos (blues, country, folk etc.) dominam o mercado musical mais importante do planeta. Seria o mesmo que artistas portugueses dominando as paradas brasileiras cantando sambas, ou baiões, com o sotaque lisboeta.

The Rolling Stone, nos primeiros álbuns, cantava uma maioria de covers de blues, rhythm & blues e rock ‘n’ roll manjados nos EUA. Um dos discos em que os Stones mais vão fundo na tradição musical americana é Let it Bleed, de 1969. Que é também um dos mais elogiados da banda. O estilo seria o que se convencionou chamar há alguns anos de “americana”, ou seja, música americana que incorpora elementos da chamada da tradição musical do país.

Gimme Shelter, que abre o álbum, é um gospel, Country Honk ecoa sonoridade de Hank Williams ou Jimmy Rodgers, pais da country music, Love in Vain (Robert Johnson), é um clássico do country blues, e por aí vai. Como seriam as nove faixas de Let it Bleed interpretadas e tocadas por americanos do universo da música country? É o que se pode conferir agora com o álbum Let It Bleed Revisited – An Ovation from Nashville, com The Rock House All Stars (Qualified Records).

The Rock House All Stars é formado por figurinhas carimbadas de Nashville, Tennessee, a capital da música country. Todos ilustres desconhecidos por cá, mas que dominam os gêneros que cantam e tocam, com sotaque do Sul dos EUA, e boa dicção (o que não é um dom de Mick Jagger que, ainda por cima, muitas vezes exagera no cockney, grosso modo, o inglês falado na região leste de Londres).  Claro, o álbum original tem a personalidade inconfundível dos Rolling Stones, mas algumas faixas aqui soam até com mais soul do que com os ingleses. Caso de You Got The Silver, com a cantora, Nalani Rothrock, que imprime a forte emoção blueseira à canção.

Todas as faixas são tocadas pela The Rock House All Stars, e interpretadas por vocalistas diferentes. Os arranjos permanecem quase os mesmos, mas se aproximam mais das raízes, feito acontece em Wild Horses, que não é de Let it Bleed (entrou como faixa bônus), e revela-se um ótimo country, no dueto de Lilly Hiatt e Luke Bulla. A produção sugeriu que os intérpretes procurassem cantor como Mick Jagger cantaria (se americano fosse), e isto torna cada faixa diferente, realçando a qualidade das composições.

Let it Bleed é um dos discos musicalmente mais consistente dos Rolling Stones. Quase todas as faixas vêm sendo incluídas no shows do grupo. Algumas estão entre as melhores parcerias Jagger/Richards, a exemplo de The Midnight Rambler, que aqui está como um blues elétrico e pesado de Chicago. Bela recriação de um álbum antológico.

Deixe um comentário

Preencha os seus dados abaixo ou clique em um ícone para log in:

Logo do WordPress.com

Você está comentando utilizando sua conta WordPress.com. Sair /  Alterar )

Imagem do Twitter

Você está comentando utilizando sua conta Twitter. Sair /  Alterar )

Foto do Facebook

Você está comentando utilizando sua conta Facebook. Sair /  Alterar )

Conectando a %s

Crie um site ou blog no WordPress.com

Acima ↑

%d blogueiros gostam disto: