Edy Star aterrissa no Recife esta semana. Dia 12, sábado, é o convidado especialíssimo de Gonzaga Leal, no espetáculo No Cordão da Saideira, no Teatro do Parque. No dia 16, quarta-feira, às 19h, Edy lança, na Passa Disco, na Rua da Hora, o autobiográfico Diário de um invertido: Escritos Líricos, Aflitos e Despudorados (Salvador, 1956 –1963). Não é a biografia do cantor, mas parte dela, abrangendo infância e juventude na capital baiana.
O livro, que está causando país afora, é uma compilação de textos escritos por Edy Star entre os anos 50 e início dos 60, em Salvador, em que conta a descoberta de que era gay (aos 12 anos, quando o termo nem era ainda usado), numa época em que o homossexualismo era considerado uma doença . O livro tem até um capítulo com piadas de “viado” que espelham bem o preconceito da sociedade em relação à “pederastia” (expressão então muito empregada). O livro foi organizado por Ricardo Santhiago, historiador da Universidade de São Paulo, e tem selo da editora Noir.
Nascido em 1938, em Juazeiro (BA), Edy Star, começou a carreira em Salvador, teve uma paisagem pelo Recife, de 1966 a 68, onde se destacou como cantor e ator, integrou o coletivo Construção, ao lado de Naná Vasconcelos, Teca Calazans ou Marcelo Melo (Quinteto Violado). No Rio, dividiu com Raul Seixas, Miriam Batucada e Sergio Sampaio e LP Sessão das 10- Sociedade da Grã Ordem Kavernista, em 1974 introduziu o glitter na MPB com Sweet Edy (Som Livre), um álbum antológico, assumidamente gay, com direito a composições de nomes como Caetano Veloso, Gilberto Gil, e até inédita da grife Roberto & Erasmo.
Dias atrás Edy Star lançou duas canções nas plataformas digitais que, embora não sejam inéditas, podem ser escutadas como a trilha do livro: Homens (Moisés Santana, de 2002), e ¿A quién le importa? (Carlos Berlanga e Nacho Canut, 1986)
DOENÇA
(…) Era a Praça Castro Alves, onde conheceu amigos gays (descobria, então, não ser o único gay do mundo) com quem formou a “Turma da Quinta Árvore”. Um era músico, o outro era enfermeiro, eu era artista, um outro era artista plástico, o quinto era um porra louca”, lembra Edi. O nome da trupe vinha de seu ponto de encontro regular: a quinta árvore descendo a praça. Divertiam-se, promoviam animados desfiles de moda, inventavam apelidos femininos uns para os outros e enfrentavam corajosamente a homofobia local: Edi, que passou a liderar o contra-ataque a agressores violentos, era chamado por isso de “Bofélia”, a bicha bofe que não tinha medo de brigas
Nem por isso os conflitos internos de Edi haviam se esvaído: sem referências públicas de homens homossexuais, vivia com um enorme sentimento de culpa e evitava se aproximar de desconhecidos tão somente para minimizar as chances de que fosse descoberto e denunciado como homossexual. A leitura de Homossexualismo masculino, do professor Jorge Jaime poderia ter potencializado esse sentimento, e, em certa medida, o fez”. Este trecho, do prefácio de Ricardo Santhiago, cita um livro em que se retratava o que o autor considerava uma anomalia. Uma obra dirigida à medicina legal. “Invertido”, ou seja, ao contrário, era um termo muito comum na linguagem policial.
Aos 85, assumido há mais de 50 anos, Edy Star contribui neste livro para a história lbgtqia+, pintando um retrato (ele também é artista plástico) da Salvador 65 anos atrás, da barra que era trafegar na contramão do comportamento sexual referendado como normal. Um livro que, mais, ou tanto quanto, do que um esboço de biografia, tem igualmente um precioso valor documental.
Grata, deweras!
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