Ao contrário do que se lê na maioria das matérias sobre a próxima ministra da cultura, a baiana Margareth Menezes não se tornou conhecida no embalo da axé music. Nos anos 80, ela fez parte de um movimento de valorização da cultura negra na Bahia, que incluía o Muzenza, o Araketu e, sobretudo, o Olodum, que estourou no rádio baiano, com Faraó (Luciano Gomes), também gravada por Margareth, Djalma Oliveira, Banda Reflexus. O Grupo Cultural Olodum, nascido no Pelourinho e no Maciel, em Salvador, chamou atenção da imprensa do Sudeste. Atraindo inclusive a atenção do caçador de sons periféricos, Paul Simon, que passou cinco dias na capital baiana, em1988, para saber o que é que a Bahia tem. Basicamente, a então a música afro-baiana, que mais tarde seria engolida pelas bandas, que até então animavam os blocos de classe média no carnaval baiano, cuja música foi rebatizada, em tom de gozação, de axé music pelo jornalista Hamagenon Brito,
Nos últimos anos da década de 80, Margareth Menezes era considerada a melhor voz da nova música da Bahia, e estrearia em disco em 1988, pela Polydor, com um álbum epônimo, mas que ficou conhecido como Elegibô, pela faixa Uma História de Yfá (Elegibô), de Ythamar Tropicália e Rei Zulu, um samba-reggae. Foi o sucesso do disco, que não agradou aos críticos do Jornal do Brasil, então um dos mais importantes do país. De oito jornalistas de cultura do JB, três omitiram-se de pontuar o LP, numa cotação que ia até o máximo de cinco estrelas, cinco atribuíram-lhe apenas uma.
Depois que bossa nova foi incorporada a linguagem musical americana, com boa parte dos principais nomes que a fizeram de volta ao Brasil, raros músicos da MPB conseguiam penetrar o fechado mercado americano. Gilberto Gil e Caetano Veloso, hoje estrelas nos EUA, não conseguiram penetração na Terra do Tio Sam. De repente, a baiana, que só cantou no Rio pela primeira vez em1989, abrindo para Gilberto Gil, foi anunciado naquele mesmo ano: participaria da turnê de Rei Momo, disco solo de David Byrne (ainda no Talking Heads). os críticos mudaram a ideia.
“Praticamente desconhecida no Brasil, a cantora baiana Margareth Menezes, de 27 anos, está conquistando o público norte-americano fazendo a abertura dos shows solo do astro David Byrne. Como num conto de fadas, Byrne, que não a conhecia, viu um videoclipe gravado por ela e convidou-a. Ela acha que os orixás têm a ver com isso (chamada de capa, no Jornal do Brasil, em novembro de 1989). Pode ser que tenha havido colaboração dos orixás. Cantora Revelação de 1988, na categoria Regional, Margareth Menezes teve sua estreia na capa do Caderno B do JB, com uma matéria da correspondente do jornal em Nova Iorque. O título: “A Protegida dos Orixás”. Quando voltou ao Brasil, Margareth fez uma temporada num clube de jazz carioca, e ganhou matérias laudatórias.
Realmente, os orixás. Embora seja conhecida no Brasil, Margareth nunca emplacou um grande hit nacional, incorporou-se, ou foi incorporada, a trupe da axé, e virou estrela do carnaval baiano. Nunca também foi grande vendedora de discos. Continua sendo a voz mais poderosa do que já foi o novo som de Salvador. E agora será ministra da cultura. Realmente, os orixás.
Para os que irão trabalhar com ele, relembro um comentário da ministra, na citada matéria do JB, de como se sentia três horas antes de entrar cena: “Não consigo comer nada. Começo a sentir uma energia forte na boca do estômago. Fico andando de um lado pro outro sem parar. As pessoas que trabalham comigo acham muito esquisito. Eu me transformo”, revelou a devota de Yansã e Ogum.
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