Rock a História e a Glória é uma revista que circulou em meados dos anos 70, tecnicamente, um fascículo, cada edição dedicada a um artista gringo. As informações que chegavam por aqui do rock nos EUA, Inglaterra (sobretudo estes países), eram diluídas, notinhas em revistões, curiosidades ou fofocas. Essa revista foi a primeira a trazer matérias consistentes, assinadas pelo primeiro time de jornalistas que escreviam sobre música, Tárik de Souza, o editor, Ezequiel Neves, Antonio Bivar, Nelson Motta, Maurício Kubrusly, Gabriel O’Meara.
Logo nos primeiros números a revista estendeu o formato fascículo à música brasileira, numa época que começavam a surgir os pós-tropicalistas, Sérgio Sampaio, Alceu Valença, a turma do Ceará, Fagner, Belchior, Ednardo e cia, Walter Franco, Paulo Tatit. Também passou a trazer encartado o Jornal da Música, este dedicado à MPB. O nome da publicação, Rock A História e a Glória, ficou meio sem sentido, mas continuou assim até o final. É um documento importante do panorama musical daqueles anos.
Da revista, transcrevo trechos de uma ótima entrevista com Belchior, que começava a despontar em 1975, impulsionado pelas gravações matadoras de composições suas por Elis Regina. Nessa entrevista Belchior estava no limiar do sucesso nacional, que veio com o LP Alucinação, de 1976.

ASSIM FALOU BELCHIOR
Ser artista
É fundamental para o artista desobedecer sempre, não reverenciar nada, nem ninguém. Nordestino é igual a qualquer outro cara. As pessoas é que acham que pelo fato de você nascer no Nordeste tica obrigado ao chapéu de couro e ao pirão de leite. Isso é uma nobreza às avessas, um padrão de nordestinidade muito furado, visão futurista e folclore. Eu sou um homem do meu tempo e por isto sou um artista do meu tempo. Eu já achava, e acho agora, que não há condições de fazer um trabalho artístico com eficiência sem rebeldia, sem violência, sem desafiar a porra dessas convenções. Ser uma pedra de contradição a todo instante.
Marginalidade
Até hoje as pessoa dizem: ele é músico, mas também é professor, ele compõe, mas estuda também. Quer dizer, o cara pode fazer a música dele, a loucura dele, mas tinha que dar uma satisfaçãozinha pro sistema, né? Eu achava, e acho, que o artista tem que ser marginal, estar por fora, contra, na margem. Para ser eficiente, o artista tem que ser uma pessoa rebelada, renegada, revoltada
Marca musical?
As palavras. Fundamentalmente minhas músicas mostram minhas palavras cantadas. Novas? Velhas? As palavras novas são as mais velhas, dentro da gente. As que falam mais radicalmente do que é humano. Não esconder o que se passa dentro da gente é sempre uma grande novidade. Eu não sei o que minhas músicas querem dizer. Sei o que dizem.
MERCADO
Rapaz, eu me sinto decepcionado. A indústria do disco é esta tristeza que todo mundo conhece. É um absurdo um disco custar 50 cruzeiros (n- como parâmetro: a revista custava 6 cruzeiros). É constrangedor que um grande número de pessoas não possa ouvir o que precisa ser ouvido. Televisão. Quem não aparece tá ferrado? Não. Não sejamos tão radicais. Não existe uma coisa que sem ela você fique morto – a não ser viver mesmo, né? Eu levo meu violão e meu canto pra todo lado. É só chamar que eu vou. Você pode não estar no jornal, mas estar na cabeça das pessoas. Não pode é tirar o corpo fora, malandro.
RISCO
Não há como criar sem risco. Sem por a vida em perigo
Deixe um comentário