Até o carnaval, vou indicar alguns discos recentes para os que não são da folia, mas escutam o que transita na contramão do que domina o mercado, em que se supervaloriza o brega, e se consome um tipo de música que já vem mastigada, sem exigir muito dos neurônios. Começo por Rosa Passos Quartet- Samba sem Você (Storyville Records), novo disco de uma cantora, compositora e instrumentista, com peculiaridades curiosas.
Ela deve ser a única artista baiana, e de Salvador, a quem os conterrâneos não cobrem de elogios e confetes. É uma das poucas brasileiras que realmente pode ser chamada de cantora de jazz. E ainda: Rosa Passos desfruta de um prestígio internacional só comparável, entre as compatriotas, ao da carioca Flora Purim, e das paulistas Eliana Elias e Tânia Maria, com a diferença de que estas tocaram as carreiras vivendo nos Estados Unidos. Rosa dos Passos continua morando no Brasil, embora circule muito mais pelo exterior.
Seu fiel e resumido séquito de seguidores pode ser aumentado com a audição de Samba sem Você, também título de parceria sua com Fernando Oliveira, gravada por ela em 1996, no álbum Pano pra Manga. O disco é composto por composições autorais e clássicos da MPB, alguns bem manjados. Mas Rosa Passos é do tipo de intérprete que recria canções cada vez que as canta, como acontecia com João Gilberto. Aliás, não por acaso ela é conhecida como “João Gilberto de saia”,
Ouça, por exemplo, Milagre, de Dorival Caymmi, com ene regravações, mas o fraseado de Rosa Passos renova este clássico, ressaltando-se a maestria dos músicos que estão com ela, Fabio Torres (piano), Paulo Paulelli (contrabaixo), e Celso de Almeida (bateria). Um quarteto completado por Rosa Passos ao violão. O disco, que traz uma dúzia de faixas, é o registro de uma apresentação ao vivo em 2001. Em 7 de julho daquele ano, Rosa Passos Quartet fez dois concertos em Copenhague, na Dinamarca. Samba sem Você vem do segundo show. O primeiro virou o álbum Dunas, lançado em 2021.
O repertório vai da manjadíssima Aquarela do Brasil, de Ary Barroso, a Nem Eu, de Sueli Costa e Aldir Blanc. Do mesmo Aldir, com João Bosco, é Bala com Bala, na qual Rosa Passos dá uma aula de suingue e improviso. Dois recursos a que a música de Dorival Caymmi se presta bem. Rosa faz deste disco quase um tributo ao Buda Nagô baiano, como o definiu Gilberto Gil, interpretando Doralice, vestido de Bolero, Nem Eu, Você Não Soube Amar, Vatapá, Milagre, e Samba da Minha Terra. Não por acaso, no ano seguinte ao desse show, ela lançou Rosa Passos Canta Caymmi.
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