Discos para quem não gosta de carnaval – GRRR Live! The Rolling Stones, em um dos seus melhores álbuns ao vivo

Como assim? The Rolling a estas alturas do campeonato? Indaga parte dos mais jovens que me lê. Os entrados na idade, nem perderão tempo lendo. Apreciam MPB ou jazz, música de gente grande. Os Rolling Stones equilibram-se entre o etarismo, já que seus integrantes têm mais tempo de  carreira do que a idade dos pais dos leitores mais novos, e o preconceito da coroada, para quem rock and roll é coisa para adolescente.

Porém o rock não é mais entretenimento infanto-juvenil desde, pelo menos, 1965. Completa 70 anos em 2024, contando-se da gravação, por Elvis Presley, de That’s All Right, em 5 de julho de 1954, o primeiro rock and roll; E aqui um adendo. Não tem esta de pioneirismo de Sister Rosetta Tharpe, Big Mama Thornton, ou Ike Turner. That’s All Right, originalmente, é um rhythm and blues, de Arthur “Big Boy” Cruddup, gravado em 1946, mas só lançado em1949. A versão de Elvis Presley é totalmente inovadora. Dá um tratamento de r&b preto à música caipira branca (ou vice-versa).. Derruba a barreira da segregação racial.  O próprio Elvis não segue o modelo de branco de interpretação.

Mas voltando às Pedras Rolantes, o quinteto inglês, cujos integrantes da primeira formação, que ainda continuam nos palcos, aproximam-se dos 80 anos, nunca foi uma banda juvenil. Nos discos da fase inicial já misturam alguma juvenilidade das canções de Chuck Berry, louvado pelas letras engenhosas, com o blues e rhythm and blues. É certo que perpetravam o que a atual cultura do cancelamento rotula de apropriação cultural. Mas foi essa apropriação cultural promovida pelos branquelos ingleses que valorizou e tirou do ostracismo, ou evitou que a ele chegassem, velhos blueseiros americanos..

GRR Live é registro de um show, realizado em 15 de dezembro de 2012, no Prudential Center, em Newark, New Jersey, na programação da turnê 50 & Counting, que celebrava meio século de estrada da banda. O repertório tem como esteio a coletânea GRRR, uma retrospectiva da longeva carreira do grupo. Claro, com tantos anos de vida, The Rolling Stones já não contribui mais com o desenvolvimento da música pop contemporânea, cada vez mais fragmentada em nichos, com consumidores específicos.  O rock and roll, que foi hegemônico até os anos 90, tornou-se afluente, em vez de principal correnteza.

Várias bandas e artistas solo dos anos 60 e 70 continuam em atividade, no entanto The Rolling Stones é o único que mantém o status de totem (já foi totem e tabu, na sua fase mais transgressora, e hedonista). Seu concertos continuam sendo eventos épicos. As 24 faixas do álbum duplo (foi lançado em todos os formatos disponíveis) têm o carimbo de clássicos da música do século 20. Canções que continuarão sendo escutadas daqui a mais meio século.

GRRR Live é o melhor álbum ao vivo do Stones em 25 anos (desde Live Licks, de 1998), que ostenta elogiados álbuns ao vivo em sua discografia. Não apenas pela ótima qualidade sonora, quanto pelas várias participações especiais, que acrescentam um molho às músicas bem manjadas, com exceção de Doom Gloom, e One More Shot, canções que estrearam nesse projeto, e que recebem suas primeiras gravações ao vivo.

Estão com os Stones em GRRR: The Black Keys (Who Do You Love?), Gary Clark Jr & John Mayer (Going Down), Lady Gaga (Gimme Shelter), Bruce Springsteen (Tumbling Dice) e o ex-Rolling Stone Mick Taylor (Midnight Rambler). Sugerir The Rolling Stones no carnaval me lembra de Caetano Veloso, num artigo de 1969, comentando sobre um show dos Stones que viu pela primeira vez em Londres: “Na Inglaterra dava a impressão que era um carnaval que entrava de repente e mudava tudo, os Rolling Stones com aquela zoadeira”.  

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