Jards Macalé 80 anos: relembrando três episódios marcantes no Rio, no Recife, e em Ouro Preto

Macalé emplaca os oitentinhas nesta sexta-feira, 3 de março. Duas lembranças mais fortes dele. No palco do Maracanãzinho, em 1969, de caftan, cabelo black pau, barbudo berrando “Cuidado/há um morcego na porta principal”. A outra. Em 1977, no Teatro Valdemar de Oliveira, o show do disco Contrastes. Entrevistei Macalé algumas vezes. Numa dessas, perdi o bloquinho com as anotações da entrevista, por telefone. Fiz só uma materiazinha.

O encontrei à noite na Maison Bonfim, em Olinda. Contei o que acontecera, ele tirou onda da minha cara. O show da saudosa Mimo (Mostra Internacional de Música de Olinda), festival tamporoso, que se foi no governo que se foi. Duas coisas que eu só fazia quando havia Mimo: entrar em igreja e ir à Olinda.

Gotham City foi quase tão polêmica quando É Proibido Proibir um ano antes. Poderia ter sido mais, se a produção do FIC não tivesse produzido as luzes, vídeo, que Macalé pretendia usar na apresentação. Ele e Capinam ainda tiveram que dar explicações à censura. Mesmo assim Gotham City causou. A vaia foi colossal para ele e a Os Brasões, que o acompanhou (colossal também para Jorge Ben e sua Charlie Anjo 45). No final, a música foi dedicada “A Batman e a Robin e a todos os homens-morcegos do mundo”. Embora a canção não tenha sido um estouro, ninguém ficou imune a ela. Nem um poeta maior: “Francamente, meu caro senhor, vá para a Gotham City que o carregue”. A frase está numa crônica de Carlos Drummond de Andrade, no Jornal do Brasil. Infelizmente não vi essa apresentação, e só li a crônica muitos anos depois.

No palco acanhado do Valdemar de Oliveira, Macalé apresentou-se apenas com o violão. Contrastes, lançado pela Som Livre, é o terceiro disco dele, o mais certinho, ma non troppo. O Macalé intérprete, que canta até forró de duplo sentido (Sim ou não, de Geraldo Gomes Mourão). Intérprete meio ator, quando a canção precisava de encenação, como Black and Blue (Waller/Razaf/Brooks), Conto do Pintor (Luiz Gustavo), Passarinho do Relógio (Cuco) (Haroldo Lobo/Milton de Oliveira). Não me recordo se cantou Gotham City ou Movimento dos Barcos.

Aí pelo meio do show, convidou ao palco um rapaz que estava na plateia. Baixinho, cabelos encaracolados, barbudinho. Naquele todo mundo era barbudinho, até eu. A Barba crescida era uma espécie de crachá dos que não compactuavam com o regime militar. O rapaz era Geraldo Azevedo. A primeira vez que o vi. Não o conhecia. O cara tocou um violão tão bom quanto o de Macalé, e antecipou duas ou três músicas do primeiro disco solo, que estava lançando também pela Som Livre. Um dos melhores shows que a que assisti.    

Epa. Teve outro momento legal com Macalé. Em Ouro Preto, numa edição da Mimo. Pouco antes de um show de Tom Zé, tô num canto da praça, o palco mais à frente, um frio da goitana. Eis que se aproxima de mim, devagar, um sujeito de sobretudo, touca ninja cobrindo a cabeça. Não dava pra ver nem os olhos. Era noite. Ele vai se aproximando e eu apreensivo. Quando chega perto de mim, e diz: “Comprei umas calcinhas a cinco reais, pra jogar no palco”. Tom Zé, nesse show, numa das canções, colocava uma calcinha na cabeça. Quando Jards se afastou, tirei a foto que ilustra a postagem.      

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