Single não é compacto. Se é que a ideia é esta. Não tenho mais certeza sobre nada. Ou como diria Sócrates, comentando sua celebrada inteligência e perspicácia “Só eu sei que nada sei”. No compacto lançava-se uma música em que se acreditava no potencial radiofônico. Se estourasse, o artista ou grupo tinha direito a um álbum, carreado pelo hit, e sem nenhum compromisso com a qualidade nas suas faixas enchimento de linguiça. Em 1965, Bob Dylan, com Highway 61 Revisited, e os Beatles, com Rubber Soul, subverteram a indústria fonográfica. Acabaram com o álbum de compactos. Um LP passou a ser um todo indissociável de suas partes.
Claro, os compactos continuaram sendo lançados, mas como um produto avulso, que não necessariamente estaria num álbum. Ou extraído de um álbum por ter se tornado uma preferida do público. No Brasil o álbum como um conceito aconteceu com a Tropicália, em cujos álbuns as faixas eram várias maneiras de expressar as ideias do grupo. Compacto morreu nos anos 90, já conhecido como single, maxi-single.
No formato digital são lançado aos borbotões. Impossível escutar todos. Para os medalhões da música popular serve muito mais para estar ganhar exposição na Internet do que para ser tocado. Nomes como Caetano Veloso, ou Gilberto Gil há anos não são de compactos, são de álbum, cujas canções são cerzidas por um conceito, vide a trilogia de Caetano iniciada com Cê, de 15 anos atrás. Um single de Cê revelaria muito pouco do conteúdo do álbum.
Anjos Tronchos, lançado como single esta semana, faixa avulsa do álbum Meu Coco, na agulha para ser lançado, pela Sony Music, é uma canção extremamente boa. Caetano continua cada vez mais antenado com o mundo contemporâneo, com a música e os sons contemporâneos, e estendendo os limites da MPB (uma sigla que já deveria ter saído de linha). Mas, particularmente, preferia que Anjo Troncho, foi single lançado depois do álbum. Ouvindo-o assim, avulso, é impossível contextualizá-lo em relação as demais faixas. Uma tela sem moldura. Assim como Bob Dylan, Caetano sempre tem muito a dizer, a música cada vez mais parece um suporte para letras longas, complexas, que se acercam do poema. (a primeira estrofe parafraseia Drummond de Andrade).
Anjos Tronchos cria ansiedade para se escutar o álbum Meu Coco. Sozinha é um objeto não identificado, belo, mas uma parte de um todo que ainda não conhecemos, e não sabemos como se encaixa, até onde a ligação com outras canções. É um peça de divulgação, um teaser para os admiradores, pra imprensa. As rádios até tocam singles, mas não de canções que trafegam na contramão da redundância e conformismo. Caetaeno continua sim por que não?
E a voz continua boa.
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